A dois dias das eleições municipais, a tensão e a expectativa tomam conta das campanhas. Cabe aos apoiadores intensificar o contato com parentes, vizinhos, amigos e qualquer grupo potencialmente capaz de reservar uma cadeira na Câmara dos Vereadores ou na prefeitura da cidade. Para os coordenadores, o momento é de bolar formas de cravar o nome do candidato na mente do eleitor. Diz o manual do correligionário: “o último gole é o que mata a sede”.
Já que a Lei da Cidade Limpa fez sumir placas, faixas amarradas de poste a poste e os muros pintados, o jeito foi transformar carros em outdoors e utilizar estruturas que cortam os caminhos congestionados da capital paulista para divulgar a imagem e os números dos postulantes a cargos no Executivo.
Sobre a Avenida Alcântara Machado, mais conhecida como Radial Leste, uma das vias mais temidas por quem deseja ultrapassar os 20 quilômetros por hora que o velocímetro do carro costuma marcar durante boa parte do dia no local, fica a passarela Salvador Rodrigues, um banquete para os grupos de apoio dos políticos.
Na manhã de primeiro de outubro, dia do idoso, Josefa Ferreira, 62, segurava o mastro preto de um bandeira com o nome de Gilberto Kassab, na entrada do lado Mooca da passarela que passa sobre os sentidos centro e bairro da Radial e culmina no lado Brás.
Desde quinta-feira, 25 de setembro, Josefa ganha para ocupar viadutos da região e promover o nome do atual prefeito, das 07 às 13 horas. Até então, tinha dado sorte: tempo frio, sol ameno. Não foi o caso dessa quarta-feira de calor intenso. Mas, ela não reclama, considera a atividade tranqüila. Pode revezar com a senhora que a acompanha e descansar sentada no chão. Para não ter problemas com os raios ultravioletas, usa um boné jeans para proteger o rosto arredondado e procura esconder o corpo de 1,52 sob a sombra da construção que serve de abrigo também para um vendedor de churrasco. Assim aguarda a chegada do “fiscal” que a levará de volta para casa.
Vestindo jaleco verde com o nome de Kassab, tênis branco e óculos de aros redondos, os quais esconde para tirar fotos, ela conta que mora no bairro Juscelino, região de Itaquera. Soube da vaga de apoiadora por meio de uma associação de idosos chamada Novo Amanhecer. “Não há nada prometido, mas disseram que se precisarem da gente depois para alguma coisa podem até chamar”. Ela fez ficha, deixou todos os dados.
O primeiro emprego foi em Pernambuco, aos 13 anos, em uma fábrica. O único “fichado”. Aos 14 veio para São Paulo com a madrinha e a mãe de uma amiga. Até completar 20 anos, trabalhou em casas de família. Depois, casou e o marido não deixou mais que ela trabalhasse fora. Há 10 anos, o esposo faleceu, vítima de diabetes. “Se não fossem meus filhos já teria voltado para Recife”, comenta, citando os quatro que teve em território paulistano.
O que mais incomoda Josefa Ferreira são os problemas da saúde pública, o tempo que demora para marcar uma consulta e o custo de vida. “Quando eu cheguei, dava para ganhar dinheiro em São Paulo. Era disso que mais gostava. Agora, nem isso dá mais”.
Será que votará no patrão a quem diz não ter a honra de conhecer pessoalmente? “Sim, estou trabalhando para o homem. Fazer o quê? Não posso trair”.
Logo à frente, Celso Jatene, vereador candidato à reeleição, revela-se um estrategista, verdadeiro Vanderlei Luxemburgo do pleito. As doações ao time Scorpions, da Vila Antonieta, bairro da zona leste, geraram voluntários. Não me refiro aos gandulas, mas aos próprios atletas da equipe.
Caso de Ricardo Pontes, 23, goleiro da equipe e um dos três craques sobre a Salvador Rodrigues. Armazenista desempregado, casado e pai de uma filha, atuou entregando panfletos nas eleições anteriores e agora segura uma faixa de plástico com a imagem, o nome e o número de Jatene na parte central da passarela. De acordo com a Lei da Cidade Limpa, não poderia fixar qualquer objeto de propaganda no local de trânsito de pedestres, porém, honestamente, com um sol de rachar quem é que vai implicar se ele amarrar as hastes de madeira ao corrimão com um arame discreto e colocar a mão por cima? Uma gambiarra inofensiva e imperceptível, já que o material não está pendurado.
Barba por fazer, não é mais garoto e assim mesmo recebeu alguns lembretes dos coordenadores da campanha: não sujar o espaço público e não jogar nada na avenida. “Somos a imagem do cara”, diz, referindo-se ao representante do PTB e ciente da responsabilidade que lhe cabe.
Às vezes senta sobre um caixote, às vezes bate um papo com os colegas de labuta. Sobretudo, é um homem de opinião: não votará em Celso Jatene. Já para prefeito, escolheu o chefe de Josefa. “Minha expectativa é que o Kassab mantenha e acelere o que está fazendo. Se outro entrar, vai ter mudança e aí pára tudo o que já tem. A saúde no nosso bairro melhorou, mas emprego ainda está difícil”, aponta.
Depois de sexta-feira, Pontes deixará a passarela e voltará à fila dos desempregados. Com um boné para se proteger do sol.
quarta-feira, 1 de outubro de 2008
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3 comentários:
Votar no patrão, pq não possso trai-lo? hehheheh inocente!! qdo algum patrão foi fiel?
"Diz o manual do correligionário: 'o último gole é o que mata a sede'."
Anotado na caderneta de provérbios!
abração
Interessante o tema, mas ainda tenho uma curiosidade: quanto ganham essas pessoas?!
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